Está nos detalhes.Em quem arruma a cama depois que acorda, lava o banheiro, quem prepara a ceia do natal. Se na sua casa ninguém precisa fazer isso, provavelmente é porque você tem uma empregada – do sexo feminino. Está nos pelos arrancados do sovaco à perna. Está no nojo, no gozo, no sangue. Está em quem fica por baixo e de quatro. Quem fica em cima de um salto alto durante toda a festa. Está em quem pari e fica com os filhos depois do divórcio. Está em quem tem um paceiro 20 anos mais jovem.
Está em quem é muito bom quando não faz nada excepcional como lavar as louças ou trocar as fraldas. Em quem é um conjugue perfeito quando não bate, nem bebe ou trai Está em quem ocupa o cargo de chefia. Está em quem usa sutiã ou hijab. Parece que são enormes as diferenças entre as mulheres amedrontadas que esperam o ônibus à noite e as sírias refugiadas que preferem se matar ao serem estupradas. Parece que oceanos separam as mulheres que não podem dirigir na Arábia Saudita das que ouvem piadas sobre serem ruins de volante, das que os companheiros gritam todas as vezes que elas estão na direção. Está na cobertura dos corpos femininos na olimpíadas. Está em quem é o gostoso e a piranha que manda nudes. Está também nos programas de televisão.
Se você acompanhou “Master Chefe” se deparou com frases como “vá varrer o chão”, “trabalhar com mulher é difícil, mulheres são mais frágeis”. Se você ao menos ouviu falar do “De Férias com o Ex”, talvez perceba que é normal os homens que transam com uma e um minuto depois com outra, que beijam ainda uma terceira enquanto a outra espera na cama sem saber. Talvez você perceba que, então, as próprias mulheres brigam entre si, se xingam: vadia. Enquanto ele, intacto, continua tendo todas à disposição. Elas concordam, vadias. Se você já assistiu “Catching Kelce” talvez repare nas 50 mulheres que sem nomes são chamadas apenas pelo estado que representam. 50 mulheres que mais uma vez se ofendem, vadias, para conquistar genuinamente o coração de um jogador famoso e milionário.
Talvez você não tenha ficado tão chocado com a banheira do Gugu quanto ficou ao assistir “I am Cait”. Se você já se deparou com “Escolas para Maridos” talvez entenda como a sociedade vem por anos e anos normatizando algumas coisas, como fica difícil que um homem entenda que não, as mulheres não se sentem envaidecidas com cantadas nas ruas, mas sim ofendidas, com vontade de se defenderem mas silenciadas pelo medo. Fica difícil que ele, então, não se descontrole e use mais uma vez aquele argumento curinga, igual a você já conheci várias… puta… Fica difícil que a esposa desse cidadão enxergue que ele não a respeita, que ele não pode simplesmente puxá-la pelo braço com um xingamento qualquer. Não é questão de separar por sexo o caráter, comportamento, escolhas ou liberdade. Não é questão de vitimizar. É questão de cultura, educação, informação, lei. É questão de repensar essas coisas “normais” às quais estamos expostos, colaborando ou aceitando. É questão de detalhes. Ser mulher está nos detalhes. Ser machista também.